Mariana, ainda criança, quis seguir sua tia para o Equador para com ela consagrar a sua vida na ordem
das Concepcionistas, dedicada à Imaculada Conceição de Maria.
Nestes tempos em
que o mundo interroga os consagrados, homens e mulheres que se consagraram e
consagram a vida a Deus, urge a voz dos que acham que a vida celibatária não
traz a felicidade e até é um despropósito para um ser humano ciente das suas
capacidades.
Para muitos, a
vida consagrada e celibatária parece um monte alto demais para quem “deseja ser
feliz” nestes nossos tempos.
Então deparo-me
com a vida de Madre Mariana que lembra-me Santa Teresinha do Menino Jesus, que
desde a tenra idade, conheceu a sua missão de consagrada em corpo e alma.
No entanto, Santa
Teresinha do Menino Jesus propõe um caminho pequenino feito de pequenas ações
quotidianas para chegar à santidade.
Mariana, por sua
vez, leva-nos por um caminho que nos aproxima mais do céu do que da terra.
Se Santa
Teresinha via nas pequenas coisas do dia a dia, oportunidades de sacrifício e
de oferecimento a Jesus, Mariana galga o caminho dos místicos.
E por isso, convido-lhe
a conhecer o dia em que Mariana professou os seus votos como consagrada.
“Ao terminar de
pronunciar os votos, foi ao Céu arrebatada em êxtase e viu e seguiu a Pessoa do
Verbo Divino, a Santíssima Humanidade unida à Divindade e o Homem Deus
belíssimo Jovem, em sua rica idade de trinta e três anos. Com inefável
Majestade e doçura desposou-se com ela, colocando em seu dedo da mão direita um
anel formosíssimo com quatro pedras preciosas. Em cada pedra vinha escrito em
latim e castelhano um dos quatro votos: pobreza, obediência, castidade e clausura.
No meio do anel, primorosamente esmaltado, havia uma estrela com o monograma do
nome de Maria.”
Mariana consagra-se
inteiramente a Jesus e Este lhe coloca um anel que resume o compromisso que
todos os consagrados devem conservar em seu corpo e alma: pobreza, obediência, castidade
e clausura.
A pobreza, por si
mesma, é um estado que vai além do estado de pobreza material. “Ter coisas” é
um estado de sentir profundamente no coração e não tanto um estado físico. Como
disse Jesus nas suas bem-aventuranças: “Bem-aventurados que têm um coração de
pobre, porque deles é o reino dos Céus.” (Mateus 5,3)
Ser santo é ser
pobre o íntimo do seu coração. É esperar o pão de cada dia, sem amontoar o que
sobrou em seu celeiro, mas distribuindo o que lhe sobra pelos que necessitarem.
Aqui entra também a fé na Divina Providência de Deus. Acreditar que Deus dará a
cada dia o necessário. O consagrado está assim entregue por si mesmo nesta “pobreza”
no ver e sentir, para estar livre e
totalmente voltado ao seu Senhor.
A obediência
surge também no anel de Mariana como garantia que a sua vontade deve se curvar
à vontade de Deus. A obediência aos superiores da ordem e antes destes, a
obediência a Deus, aos seus mandamentos, à Vontade de Deus, movida pelo
verdadeiro magistério da Igreja. O consagrado move-se pela obediência como
criança nas mãos do Pai Eterno, sob o manto da Mãe Santíssima. O consagrado
move-se assim como humilde serva do Senhor, sem interrogar o caminho, mas sim,
dizer o sim dos que põem a mão do arado e semeiam o campo, mesmo que nada possa
nascer dele. Como Santa Rita de Cássia que obediente à sua superiora rega um
tronco ressequido do jardim, sem nada esperar ou refletir da utilidade da sua
ação. E foi com este ato de fé e de obediência de Santa Rita que fez o tronco ressequido
germinar novamente como resposta à obediência que o ser humano deve ter a Deus,
apesar das perseguições e dificuldades que o caminho de santidade se mostrar.
A castidade é
então o voto que se alia a esta obediência como folhas que dão vida mais
robusta e verdadeiramente livre. O celibato dos consagrados é esta pérola de
total entrega a Deus. Só Deus basta, como diz Santa Teresa. Quem tem Deus, que
mais precisa, que mais deseja? São as virgens prudentes (Mateus 25, 13), que
aguardam o esposo e ouvem o seu chamado em plena noite, tendo óleo suficiente
para manter acesas as suas lâmpadas, enquanto aguardam a sua chegada. A parábola
das virgens que estavam ou não preparadas para ir ao encontro do seu esposo é
uma chamada de atenção de Jesus para esta separação entre os que tem o “óleo suficiente
para acender as suas lâmpadas” e os que não tem. Este óleo da total entrega de
quem não dorme enquanto a espera a volta do seu Senhor, conseguiram ter o óleo da
santidade em suas lamparinas para acendê-las, e assim conseguirem caminhar
seguro ao encontro do seu Amado Jesus. “Vigiai, pois, porque não sabeis, nem o
dia e nem a hora”. (Mateus 25, 13)
A clausura é
então este recolhimento da alma no mais íntimo espaço junto a Jesus. Nem todos
os consagrados vivem em clausura, separados do mundo. Mas penso que esta clausura
espiritual é onde se encontram todos os consagrados que ali no interior da sua
alma encontram-se com o seu Amado Jesus. Ali, aonde o mundo não entra, está a
alma junto aos pés de Jesus, beijando-lhe as suas chagas e sentindo-se tão
amada e inebriada por uma paz infinita. O amor verdadeiro preenche inteiramente
o coração, pelo que tudo o mais é excesso e desnecessário.
Para além das
pedras dos seus votos, o anel da consagração que Jesus deu a Mariana tem ainda
o monograma de Maria, a Mãe Santíssima que leva os seus filhos queridos ao
Filho Jesus. Pelas mãos de Maria, eis que Jesus se mostra mais perto, com a
clareza de quem atinge o céu sem tantas explicações racionais. Basta que a Mãe
diga que é assim, que o filho sabe que é o certo e melhor para ele. Maria calca
aos pés, a serpente que ilude e coloca no coração humano a dúvida e a falta de
confiança na Vontade Divina.
Maria nos leva
pela mão, resgatando-nos do que julgamos achar certo, e que pela mentalidade
infantil que temos a respeito da vida, só por Ela, é possível avançar sem medo
na Vontade de Deus para a nossa vida.
Por isso, na profissão
dos seus votos, Mariana teve como padrinhos da sua consagração, a Santíssima
Virgem e o castíssimo esposo São José.
O que espera a
vida de um consagrado, senão a cruz neste mundo?
Por isso, Jesus presenteia
a sua cruz à sua esposa consagrada Mariana, “com todas as dificuldades e penas
que padeceu em sua vida mortal”.
O mundo não
percebe o caminho dos consagrados. Cada vez mais, por nossas ruas e modas
hodiernas, há um escárnio diante dos hábitos dos consagrados. Um padre com sua
batina ou uma freira com o seu hábito é contradição para o mundo que tanto
deseja ser feliz encharcado de bens materiais.
O amor é vendido
neste mundo em uma grande embalagem de prazer e quando tal não é conseguido, é
logo pisado aos pés e calcado. Porém, existe um abismo enorme entre o prazer e
o amor. O verdadeiro amor é fonte de prazer, mas nem todo o prazer produz amor.
O prazer que o verdadeiro amor oferece não se desenha assim com cores da paixão
ardente pois este fogo apaga-se mal chove uma contrariedade.
O verdadeiro amor
é esta cruz que Jesus nos oferece. Sim, o amor verdadeiro aceita a cruz de amar
o outro, seja na alegria ou na dor, seja na tristeza ou na alegria, seja quando
tudo corre bem ou quando tudo correr mal. O verdadeiro amor prova-se no tempo e
não no momento. O tempo irá dizer-te se aquela pessoa te ama verdadeiramente ou
não. Nunca se poderá medir um amor apenas por uma palavra, mas sim por vários
gestos, ao longo do tempo.
O mundo tem
pressa de ser feliz, porém o amor verdadeiro não tem pressa de se expor. O amor
verdadeiro é como aquele tronco ressequido que Santa Rita de Cássia regou generosamente
sem nada esperar. Ao regar, colocava não apenas água, mas o amor totalmente
gratuito e sem esperar retorno humano. Por isso, o tronco que se julgava morto,
reviveu.
Se o amor não
ressuscitar o outro da sua morte espiritual, não é verdadeiro amor. Se o meu
amor não poder semear no outro a esperança, de que valerá este sentimento se esvai-se
em alguns momentos de prazer.
Por isso o
verdadeiro amor é aquele que carrega a cruz do outro. E esta é a felicidade que
Jesus propõe a todos que O amarem.
“Vinde a mim, vós
todos que estais aflitos sob o fardo, e
eu vos aliviarei. Tomai o meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque
eu sou manso e humilde de coração, e achareis repouso para as vossas almas. Porque
o meu jugo é suave e o meu peso é leve.” (Mateus 11, 28-30)
A vida de um
consagrado é a vida de imolação. Se antes, os pagãos sacrificavam animais e até
pessoas para os seus deuses, aguardando que assim estes deuses seriam benéficos;
com o Deus dos cristãos, esta oferta não é por obrigação mas sim por aceitação
livre, vocação de consagrado, viver neste mundo o que na vida além morte os
aguardaria.
O consagrado vive
antecipadamente o encontro com o Senhor que a morte física traz a todos,
crentes e não crentes.
O consagrado são
estas almas que se sacrificam neste mundo pelos outros. São estes, o sal da
terra (Mateus 5,13) que favorece a tantos com o dom da fé.
Santa Teresinha do
Menino Jesus sentiu que a sua consagração poderia salvar a muitos, e ainda antes
de entrar no carmelo, rezou e ofereceu sacrifícios por um condenado à morte,
cuja história conheceu dos jornais da sua época, para que não se condenasse
eternamente.
Se estes santos se
sacrificavam por desconhecidos porque não nos se sacrificaríamos por nossos familiares
e amigos?
A verdadeira
alegria é salvar as almas dos que mais estimamos, leva-las para perto de Jesus,
para sentir esta verdadeira felicidade, a eterna, a que nunca acaba, a que não
finda com a morte física.
Sim, desejo ser
feliz, tendo Jesus e levando Jesus a todos os que me cercam. Esta é a
verdadeira felicidade pois só Jesus preenche inteiramente o coração humano. Em
Jesus, a cruz ressuscita e nada é em vão, nesta vida, quando oferecido a Deus,
pela nossa conversão e pela conversão de quem mais amamos.
A história de Madre
Mariana me convida a ir mais além do que julgamos e concebemos quando falamos
de amor.
O que é o amor,
senão esta verdadeira alegria de ver o outro feliz, de saber que aonde estamos
bem, queremos que o outro esteja também.
Mariana convida-me
a olhar os consagrados de hoje como as lamparinas que ainda iluminam as trevas
neste caminhar às escuras dos relativismos por um caminho seguro e reto, o
caminho de Jesus.
A história da
Madre Mariana de Jesus Torres foi consultada no livro “Vida admirável
da Reverendíssima Madre Mariana de Jesus Torres – Mística confidente de Nossa
Senhora do Bom Sucesso”. Este livro foi
escrito pelo Rvdo. Padre Manuel Sousa Pereira da Ordem Seráfica dos Menores do
Convento Máximo de São Francisco de Assis de Quito, Equador.
Versão on line
disponível em
Convido-lhe a conhecer um pouco da história de Madre Mariana em
Sobre Santa Teresinha do Menino Jesus
Sobre Santa Rita de Cássia
As fotos usadas neste artigo são pinturas originais de Gráccio Caetano